Eu ando queimando todas as cartas de amor que me mandaram. Não há razão,
nem sentido em guardar recordações que somente servem de enfeite no seu quarto,
o perfume em cada papel, em cada folha, cada cheiro diferente uma da outra
carta, perfume de corpos que eu dormia nas noites malucas e insanas de amor que
eu fiz.
Quando estamos com a pessoa que amamos, nos distraímos e ao mesmo tempo
você está feliz, e você nem vê o tempo passar, as horas passam, elas voam,
quando se é feliz, o tempo faz você ficar distraído, porque você nem percebe o
tempo passar, de tão bom que é aquele momento. E eu sinto falta de todos os
momentos de amor, que eu tive, dos momentos apaixonantes de apenas uma noite,
ou de uma manhã de domingo. A saudade é um sofrimento admirável, e eu sinto
falta de todas as pessoas que eu amei. Então estou me livrando das fotografias,
dos presentes, dando para outras pessoas que precisam mais do que eu neste
momento. Pois eu não quero reviver momentos bons através de meras cartas.
Nada me encanta mais, eu não gosto de ter algo guardado no meu
quarto de uma pessoa que não está mais aqui, porque é como se a pessoa, um pedaço dela, um
vestígio dela ainda estivesse ali na sua cama, nas suas veias, na sua mente. Mas
na verdade ela não está. É uma doce ilusão. Eu não quero olhar, eu não quero
sentir saudade.
Eu quero caminhar, vagar, me perder, mas não quero levar ninguém comigo.
Eu estou em estado de coma, você me vê, e fala comigo, sente as minhas mãos.
Mas eu não te olho, não consigo falar, me expressar, pois eu não consigo sentir
nada. Nada além de mim mesmo.